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Distribuição e mobilidade populacional em uma unidade de conservação na Amazônia Brasileira
Distribution and population mobility in a conservation unit in the brazilian amazon
Revista Presença Geográfica, vol.. 06, núm. 02, 2019
Fundação Universidade Federal de Rondônia

Artigos



Recepção: 04 Janeiro 2018

Aprovação: 12 Outubro 2019

DOI: https://doi.org/10.36026/rpgeo.v6i2.2957

Resumo: O objetivo deste trabalho foi descrever a distribuição e a mobilidade da população na FLONA de Itaituba II, e propor uma estimativa demográfica baseada em trabalho de campo realizado no período de 25 de junho a 20 de agosto de 2009. A metodologia adotada baseou-se na combinação de métodos e instrumentos como Survey e georreferenciamento de todas as unidades domésticas e indivíduos no interior da FLONA e, um recorte das bacias e sub-bacias, para entendimento do uso dos recursos naturais no interior ou no entorno da unidade, a partir dos seguintes fatores de espaços: local de residência, características sociodemográficas, entre outros atributos socioeconômicos. Na análise dos dados considerou-se as perspectivas de restrição quanto à presença humana e uso dos recursos naturais, visando compreender a relação da dinâmica das populações e suas características com as ações verificadas na Unidade de Conservação - UC. Na FLONA de Itaituba II a população é pequena está organizada em aglomerados distribuídos nas margens da BR-163, ao longo de rios e igarapés, assim pode-se destacar que existe mobilidade interna na UC. Há ocorrência de técnicas produtivas incompatíveis com os objetivos de uma UC, por exemplo, o garimpo. As condições identificadas no processo social que se reflete na composição da população residente na UC, sendo fundamental que o poder publico promova ações que levem a transformação de comportamento da população local diante das regras estabelecidas para o manejo dos recursos naturais em área de UC.

Palavras-chave: Recursos Naturais, Atividades Produtivas, Área Protegida de Uso Sustentável.

Abstract: The objective of this work was to describe the distribution and mobility of the population in the FLONA de Itaituba II, and to propose a demographic estimate based on field work performed from June 25 to August 20, 2009. The methodology adopted was based on the combination of methods and instruments such as Survey and georeferencing of all domestic units and individuals within FLONA and a cut of the basins and sub-basins to understand the use of natural resources in the interior or in the environment of the unit, from the following space factors: place of residence, socio-demographic characteristics, among other socioeconomic attributes. The analysis of the data considered the perspectives of restriction regarding human presence and use of natural resources, aiming to understand the relation of population dynamics and their characteristics to the actions verified in the Conservation Unit - UC. In FLONA of Itaituba II the population is small, it is organized in clusters distributed along the banks of the BR-163, along rivers and streams, so it is possible to emphasize that there is internal mobility in the UC. There is an occurrence of productive techniques incompatible with the objectives of a UC, for example, mining. The conditions identified in the social process that is reflected in the composition of the resident population in the UC, being fundamental that the public power promotes actions that lead to the transformation of behavior of the local population in front of the established rules for the management of the natural resources in UC area.

Keywords: Natural Resources, Productive Activities, Protected Area of Sustainable Use.

1. INTRODUÇÃO

No Brasil, a Lei n.º 9.985, de 18 de julho de 2000, instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), que no Art. 2º, inciso primeiro, define Unidade de Conservação como “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”. No Art. 7º, as UCs integrantes do SNUC dividem-se em dois grupos, com características específicas: I - Unidades de Proteção Integral, que tem o objetivo de preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos nesta Lei; e II - Unidades de Uso Sustentável com objetivo de compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais (BRASIL, 2000).

Existem diversas categorias de UCs, nos níveis federal, estadual e municipal, que são divididas em três tipos: aquelas em que a presença humana poderá ser proibida, tais como a Estação Ecológica e a Reserva Biológica; as que a visitação pública é permitida, como é o caso do Parque Nacional - PN, do Monumento Natural - MN, do Refúgio da Vida Silvestre - RVS, da Reserva da Fauna - RF, e da Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN; e, ainda, aquelas em que a ocupação humana, parcial ou total, faz parte de suas finalidades, como na Área de Proteção Ambiental - APA, na Área de Relevante Interesse Ecológico - ARIE, na Floresta Nacional - FLONA, na Reserva Extrativista - RESEX e na Reserva do Desenvolvimento Sustentável - RDS (NAVES, 2013; IBAMA, 2014).

Destaca-se que a aceitação da ocupação humana em áreas protegidas, residentes quando de sua criação, ocorreu via a regulamentação e o controle do uso dos recursos naturais, com o marco político relacionado à criação e gestão de unidades de conservação no Brasil assentado na Lei nº 9.985, que em julho de 2000, instituiu o SNUC, que é composto pelo conjunto das UCs federais, estaduais e municipais.

Segundo Schenini (2004), as primeiras UCs no Brasil, foram criadas sem nenhum critério técnico e científico, ou seja, foram estabelecidas meramente em razão de suas belezas cênicas. Aos poucos foram criados vários parques nacionais e outras modalidades de conservação nas diversas regiões brasileiras, até a década de 40, os primeiros parques localizaram-se, principalmente, na região sul/sudeste - por apresentar maior concentração populacional urbana (DIEGUES, 1995).

É bem notório que a criação de parque no Brasil, foi aos poucos se consolidando, mas de forma muito lenta. Brito (2000) no tocante a questão dos parques, comenta que: “os objetivos estéticos e científicos justificaram a criação das primeiras áreas protegidas, os parques nacionais, a partir do final do século XIX, e que eram considerados incompatíveis com a ocupação humana em seus limites”, enquanto que Teixeira (2005) elucida que a proposta de delimitação de áreas protegidas sem ocupação humana, presente na criação dos primeiros parques nacionais, foi gradativamente modificada pela inexorável presença da sociedade no espaço que se pretendia proteger. Já a criação de reservas florestais, foram aos poucos se materializando, levando-se em consideração a questão do manejo florestal (técnicas apropriadas).

Guerra (2012), afirma que no Brasil, priorizou-se a ocupação de áreas onde havia concentração populacional para conservação de ecossistemas remanescentes. Logo, as populações passaram a ser consideradas, e essa compreensão ocorreu também na Amazônia brasileira, quando se verificou que a resistência a destruição das áreas protegidas. Quanto a possibilidade de manutenção da ocupação humana em áreas protegidas Diegues (2000) alude que a década de 70 apresenta um controle de recursos naturais em decorrência da ocupação do homem, mas que anos posteriormente, esta ocupação acontece levando-se em consideração a questão da sustentabilidade.

No tocante a presença humana em UC na Amazônia, ainda que possa ser vista como uma fonte de conflitos é um componente essencial para a existência de unidades de conservação (GUERRA; COELHO, 2012). Quanto às unidades de uso sustentável, na Amazônia, D’antona et al. (2013), afirma que a boa parte da população se encontra nas RESEXs (226.689 hab.) e nas FLONAs (65.196 hab.).

Segundo Bueno e Dagnino (2011), o fato de existir população morando nesses espaços, não é uma questão preocupante, o que é preocupante é o fato de como essas populações que já viviam nesses espaços, antes mesmo de se tornarem áreas protegidas, se comportam diante da imposição de regras específicas para a preservação dos recursos, que de certo modo implicam na subsistência e modo de vida tradicional dessas populações.

Considerando esse contexto, o objetivo deste trabalho foi descrever a distribuição e a mobilidade da população na FLONA de Itaituba II, e propor uma estimativa demográfica baseada em trabalho de campo realizado no período de 25 de junho a 20 de agosto de 2009.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Área de Estudo

A FLONA de Itaituba II é uma categoria de área protegida de uso sustentável de posse e domínio público provida de cobertura florestal predominantemente nativa criada em 02 de fevereiro de 1998, por intermédio do Decreto Presidencial, sob o número 2.482/98. É limitada pelas coordenadas 04°40’ Sul e meridianos 56°10’ Oeste, compreendem 440.500 ha, na mesorregião Sudoeste do Estado do Pará (Figura 1), abrangendo os municípios de Itaituba com uma área territorial de 203.209,9214 ha (46,14%) e Trairão com um total de 237.290,0786 ha (53,86%) (ICMBIO, 2014).


Figura 1:
Localização da Floresta Nacional de Itaituba II.
Fonte: Produzido pela autora 1

Cabe destacar que devido à projeção de hidrelétricas na região do Rio Tapajós, no dia 25 de junho de 2012, os limites da unidade foram alterados por meio da Lei n. 12.678, que excluiu 28.453,35 ha da FLONA de Itaituba II que passou a ter 412.046,65 ha (BRASIL, 2012).

A FLONA de Itaituba II localiza-se na Mesorregião Central (médio Xingu e Tapajós), a qual engloba as regiões centrais e sudoeste do Pará e sudeste do Amazonas; e na subárea baixo e médio Tapajós, que inclui as áreas dos municípios de Apuí e Maués no Amazonas; e Jacareacanga, Itaituba, Novo Progresso, Trairão, Aveiro, Rurópolis, Placas, Altamira e São Félix do Xingu no Pará. O nome da FLONA de Itaituba II está relacionado ao nome do município que abriga suas maiores áreas. Apesar de a UC atingir também no município de Trairão, desmembrado de Itaituba e emancipado em 1991 (ICMBIO, 2014).

A FLONA de Itaituba II contribui com a conservação de 0,09% (412.046,65 ha) da área do bioma amazônico, respectivamente têm por objetivo o manejo de uso múltiplo e de forma sustentável dos recursos naturais renováveis, a manutenção da biodiversidade, a proteção dos recursos hídricos, a recuperação de áreas degradadas, a educação florestal e ambiental, a manutenção de amostras do ecossistema amazônico; em concordância com o objetivo destinado às FLONA definido pela lei do SNUC, de 2000 (ICMBIO, 2014).

É uma UC inserida na Área de Influência do Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) da BR-163 e na área de abrangência do Distrito Florestal Sustentável – DFS da BR-163, um grande mosaico formado por UCs onde são priorizadas políticas públicas que estimulam o desenvolvimento integrado com atividades de base florestal (Ibidem). Sob o ponto de vista do potencial econômico, da riqueza da diversidade biológica, das riquezas naturais e da diversidade cultural e étnica, essa é uma região muito importante da Amazônia. É cortada por dois importantes eixos rodoviários, a BR-163/PA e a BR-230, além da hidrovia do Tapajós-Teles Pires e de diversas pistas de pequeno porte no seu interior, apresenta diversos aglomerados populacionais na região da Unidade (ICMBIO, 2014).

O INMET (2015) classifica que na região da FLONA, a estação mais chuvosa ocorre entre os meses de fevereiro a abril, e a estação mais seca, entre julho a setembro, o excedente de água no solo, verificado por meio da análise do balanço hídrico, corresponde ao período de fevereiro a julho, e apresenta valores superiores a 750 mm– março tem o maior índice, e entre agosto e dezembro, com destaque para setembro, há uma grande queda nesse excedente, com valores inferiores a 90 mm.

A rede hidrográfica na região das FLONAs é caracterizada por uma vasta malha de rios, com destaque ao rio Tapajós e seu principal afluente, o rio Jamanxim, sendo que a partir desses, surgem diversas sub-bacias e pequenos igarapés que podem variar em tamanho de um pequeno riacho a rios de porte navegável, também abriga uma rica fauna, com diversas espécies de interesse para a conservação, com espécies endêmicas ou sujeitas a algum tipo de ameaça, e apresenta um mosaico de formações florestais, intercaladas com áreas abertas e antropizadas, além de ambientes aquáticos, que proporcionam a existência de uma fauna bem diversificada (ICMBIO, 2014)

2.2 Elaboração de Mapa Base de Campo

Para elaboração do mapa base da FLONA de Itaituba II, primeiramente se utilizou dados secundários provenientes de instituições como Ministério do Meio Ambiente - MMA, Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade - ICMBio e Serviço Florestal Brasileiro - SFB, com informações sobre hidrografia e vias de acesso e a partir dos polígonos do limite da FLONA[4], posteriormente foi criado um buffer (entorno) - uma faixa de 10 km de distância, no qual, a região de estudo foi dividida em 12 bacias e sub-bacias e/ou Microbacias presentes na área da FLONA de Itaituba II e entorno (10 km), a delimitação da área em sub-bacias e ou Microbacias, foram em conformidade com os seguintes critérios:

- Bacia Hidrográfica: definida como um conjunto de terras drenadas por um rio e seus afluentes, formada nas regiões mais altas do relevo por divisores de água, onde as águas das chuvas, ou escoam superficialmente formando os riachos e rios, ou infiltram no solo para formação de nascentes e do lençol freático. As águas superficiais escoam para as partes mais baixas do terreno, formando riachos e rios, sendo que as cabeceiras são formadas por riachos que brotam em terrenos íngremes das serras e montanhas e à medida que as águas dos riachos descem, juntam-se a outros riachos, aumentando o volume e formando os primeiros rios, esses pequenos rios continuam seus trajetos recebendo água de outros tributários, formando rios maiores até desembocarem no oceano (BARRELLA, 2001).

- Sub-bacia: bacias podem ser desmembradas em um número qualquer de sub-bacias, dependendo do ponto de saída considerado ao longo do seu eixo-tronco ou canal coletor. Cada bacia hidrográfica interliga-se com outra de ordem hierárquica superior, constituindo, em relação à última, uma sub-bacia. Portanto, os termos bacia e sub-bacias hidrográficas são relativos (SANTANA, 2004).

- Microbacia: são áreas formadas por canais de 1ª e 2ª ordem e, em alguns casos, de 3ª ordem, devendo ser definida como base na dinâmica dos processos hidrológicos, geomorfológicos e biológicos. As Microbacias são áreas frágeis e frequentemente ameaçadas por perturbações, nas quais as escalas espacial, temporal e observacional são fundamentais (CALIJURI; BUBEL, 2006). Os autores adotam unidades hidrológicas e ecológicas para conceituarem o termo Microbacia hidrográfica.

De modo que a Microbacia hidrográfica tomada como unidade de análise é entendida como a base geográfica para se tratar a ocupação do espaço físico, enquanto gestão e monitoramento dos recursos naturais voltados a um planejamento regional agroambiental, recoberto por ações multi-institucionais (LIMA; PONTE, 2009; SANTOS; ROMANO, 2005; BRAGAGNOLO; PAN, 2000). No entanto, é preciso atentar que tal unidade fisiográfica, drenada por cursos d’água conectados, que convergem para um leito comum maior e fronteirizados por espigões, nem sempre coincide com os limites políticos municipais, e mesmo com espaços regionais econômicos, historicamente construídos pelo desenvolvimento das forças sociais de produção.

É relevante aqui mencionar que a metodologia utilizada foi a partir das informações secundárias acerca da geomorfologia, do solo, da vegetação e da própria hidrografia que estabelecem as Microbacias, sendo que após interpretação das cartas topográficas e temáticas, foi composto o mapa de campo. Os procedimentos adotados partiram da análise morfométrica, com o levantamento cartográfico e a delimitação da bacia hidrográfica da FLONA de Itaituba I e da FLONA de Itaituba II com base no mapa topográfico. Assim subdivididos: características geométricas (delimitando a área, o perímetro e o fator de forma); e características do relevo (declividade e altitude); características da rede de drenagem (ordem dos cursos d’água e densidade de drenagem).

Para efeito explicativo foram atribuídos nomes identificadores para cada uma dessas bacias e sub-bacias e ou Microbacias (Tabela 1) (Figura 2), no entanto para este estudo foram utilizadas apenas as Microbacias de 1 a 11. Destarte, a importância para a análise do mapa base na orientação dos trabalhos de campo, auxiliando nos melhores caminhos e identificação de rios, igarapés, das propriedades, comunidades, vicinais e outros.

Tabela 1.
Bacias e Sub-bacias e ou Microbacias dos Rio Tapajós e Jamanxim no interior da área da FLONA de Itaituba II e área de influência de 10 km.

Fonte:INEA, 2010


Figura 2:
Bacias e sub-bacias e/ou microbacias hidrográficas na região da FLONA de Itaituba II.
Fonte:INEA, 2010.

2.3 Coleta de Dados Socioeconômico e Populacional

As coletas de dados ocorreram no período de 25 de junho a 20 de agosto de 2009 nas comunidades do interior e do entorno da FLONA de Itaituba II via fluvial (rio Tapajós), terrestre (BR-163 e 230) e aéreo (pistas).

Os dados socioeconômicos e populacionais foram obtidos por meio do banco de dados primários do Instituto de Estudos Integrados Cidadão da Amazônia - INEA que estabeleceu a realização do survey, das entrevistas e no acompanhamento de atividades relevantes (observação direta[5]), em momento de trabalho de campo como integrante da equipe técnica.

Na pesquisa foi adotada a combinação de métodos quantitativos e qualitativos (mixedmethods[6]) conforme Tashakkori e Teddlie (1998) e D’Antona et al. (2013), em que métodos quantitativos e qualitativos são articulados, combinados, por justificar-se como essenciais para estudos socioambientais. Foram utilizados questionários com questões fechadas e abertas com grupos de variáveis a investigar, destacando-se aquelas que permitiram abordar o volume da população, procedência e tempo de permanência na área, composição etária composição por sexo, escolaridade, estrutura familiar e modos de vida. Priorizou-se aplicar questionários em todas as Unidades Domésticas - UDs identificadas no interior da FLONA de Itaituba II e aleatoriamente em algumas UDs no entorno da unidade.

Na caracterização dos grupos populacionais no interior ou no entorno da unidade adotou-se os fatores, tais como:

a) Local de residência com referência à FLONA de Itaituba II (dentro, no entorno ou fora);

b) Características sociodemográficas: volume da população, procedência e tempo de permanência na área, faixa etária, sexo, escolaridade, estrutura familiar e modos de vida;

c) Atividades desenvolvidas no interior da FLONA ou no seu entorno imediato (coleta, cultivo, criação e outras), fontes de auto sustento e renda;

d) Pela observação direta, realizou-se o acompanhamento e documentação das atividades principais (mais significativas) dos modos de vida e produção dos grupos sociais identificados.

Na localização, identificação e caracterização da população da FLONA de Itaituba II cujos interesses ou ações tenham lugar na UC e/ou em seu entorno estabeleceu-se a localização espacial das UDs (interior, buffer e fora) e, pela classificação das habitações (ocupadas, fechadas e abandonadas) conforme condições no momento da pesquisa (Figura 3).

Para facilitar na localização das UDs no campo, realizou-se a inserção das dimensões da grade cartográfica da FLONA com buffer (10 km) pré-estabelecido no GPS, assim definir com apoio do mapa a classificação das unidades domésticas no momento em campo. A Figura 4 ilustra a classificação definida (interior, buffer e fora) para a localização das unidades domésticas na FLONA.


Figura 3:
Desenho esquemático para localização (interior, buffer e fora) das unidades domésticas na FLONA de Itaituba II durante atividade de campo.
Fonte:D’antona, 2010.

Utilizou-se receptor de GPS para a coleta dos pontos (coordenadas geográficas) das comunidades, estabelecimentos, unidades domésticas na área de estudo; que permitiu salvar os pontos no receptor e anotar nos questionários quando da sua aplicação.

2.4 Processamento de Dados

A partir dos questionários (do survey) preenchidos e revisados, ocorreu a inserção dos dados dos questionários num banco de informações em MicrosoftAcces offline. Posteriormente, os dados foram integrados ao software Statistical Package for the Social Sciences – SPSS, para realização das análises estatísticas.

Os arquivos com as informações de campo dos receptores de GPS foram unidos no software Trackmaker e processadas, considerando as configurações dos receptores, individualizados por: comunidades e vilas, unidades domésticas, garimpos, fazendas, sítios, estabelecimentos de ensino, infraestrutura, dentre outros.

Após a identificação dos pontos foram gerados arquivos em shapes (extensão.shp), e a inserção das bases de dados (em shapes) e as informações secundárias (hidrografia, limites municipais, delimitação da FLONA de Itaituba, rodovias e outros) foram importados para software ArcGis. Assim, as informações coletadas em campo na forma digital foram sistematizadas por meio do Sistema de Informação Geográfica - SIG para a integração dos dados e análises por meio da sobreposição dos Layers (Camadas), e posteriormente foram confeccionados os mapas temáticos. Esses mapas foram gerados na escala de 1:250.000, com a localização georreferenciada e identificação dos aglomerados populacionais, unidades domesticas e atividades produtivas existentes.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Origem da População

Foram identificadas 221 UDs, considerando o número de registro de coordenadas dos domicílios identificados e ocupados durante as atividades de campo, durante a pesquisa foram registrados 847 indivíduos nessas UDs, a maior parte desses indivíduos identificados, nasceu na região norte (65%), seguido pela Nordeste (14,3%), Centro-Oeste (8,3%), Sul (7,8%) e a menor parte é nascida na região Sudeste (1,7%).

Ao desagregar essa informação por Unidade da Federação, percebe-se que a maioria nasceu no próprio estado do Pará e no estado do Maranhão (Tabela 2). Segundo o GTA (2014), os moradores da floresta amazônica são cada vez mais nativos da região e Moreira et al. (2008), considera que na década de 70, as regiões que contribuíram de forma mais significativa para com o êxodo rural foram o Nordeste e o Sudeste, onde o mercado urbano se tornou expansivamente atrativo e que a região Sul também representou uma grande fatia neste processo, atribuindo o êxodo rural à repulsão das técnicas de produção e medidas poupadoras de mão de obra.

Tabela 2.
Estado de nascimento dos moradores da FLONA de Itaituba II

Fonte:GTA (2014)

Há pessoas que estão na região da FLONA de Itaituba II, há várias décadas, 283 chefes de domicílios informaram o período de chegada para fixar residência na FLONA, sendo que alguns já têm sua origem nesse local, três informara que estão no local desde os anos de 1940 e 1941, dois informaram que estão no local desde a década de 50, seis informaram estar no local desde os anos 60, nove desde a década de 70, 38 desde a década de 80, 58 desde os anos 90 e 167 entre o período dos anos de 2000 a 2009. Destes chefes de domicílios, 35% estavam no local antes no ano de 1998, ano de criação da FLONA de Itaituba II e 65% estão no local após o ano de criação.

Para Bueno e Dagnino (2011), a presença de moradores dentro de UCs é uma realidade em muitas regiões do Brasil, e na Amazônia não é diferente, a presença de populações nesses espaços é parte de um indicador da dinâmica populacional em algumas áreas rurais da Amazônia que deve considerar os aspectos demográficos, políticos, culturais e sociais. Segundo o SNUC Art.17, nas FLONAs é admitida a permanência de populações tradicionais que habitam quando de sua criação em conformidade com o disposto em regulamento e no plano de manejo da unidade (BRASIL, 2000).

3.1.1 Composição e distribuição da população estimada

Foram identificadas no interior da FLONA 65 unidades domésticas com 197 moradores, no buffer foram identificadas 146 unidades domésticas com uma população de 604 pessoas, fora da FLONA identificou-se 10 unidades com 29 pessoas, nas 221 unidades domésticas identificadas, 17 informaram não pertencer às unidades onde estavam no momento da pesquisa, são pessoas que estavam de passagem na FLONA. Identificou-se um total de 847 indivíduos, incluindo os que estavam de passagem na FLONA, no momento da pesquisa.

Visitou-se 202 estabelecimentos produtivos, destes, 128 situam-se dentro da FLONA de Itaituba II, 72 encontram-se dentro do buffer e dois estão fora, (Tabela 6). Estudos de Bueno e Dagnino (2011) e D’Antona et al. (2013), baseados em dados da contagem de população de 2007 do IBGE, estimaram que o volume de população residindo dentro e no entorno das UCs federais na Amazônia Legal chega a 334 mil habitantes, desse total, 115 mil pessoas residem dentro de UC, sejam elas de uso sustentável ou de proteção integral.

O entorno das UCs é relativamente mais populoso, abrigando aproximadamente 4,5% da população total da Amazônia (D’ANTONA et al., 2011). As unidades de proteção integral são menos populosas e menos povoadas do que as de uso sustentável, aproximadamente 11 vezes menor, a primeira categoria ocupa uma área sensivelmente maior que a segunda categoria (D’ANTONA, 2013).

As unidades domésticas identificadas concentram-se em aglomerados de tamanhos distintos, em estabelecimentos agropecuários e também garimpos. O que pode se inferir que a população está organizada por comunidades, destacando-se a comunidade de Bela Vista do Caracol (no buffer) com 177 pessoas e o garimpo Botica no interior da FLONA com 28 indivíduos (Tabela 3 e Figura 4). Além das unidades domésticas ocupadas identificadas e localizadas, as unidades domésticas abandonadas (em estado precário) ou fechadas (sem residentes no momento) foram mapeadas para compor a identificação e localização (Figura 4).

Tabela 3.
Distribuição da população por comunidade na FLONA de Itaituba II.

Fonte:GTA (2014)


Figura 4:
Unidades domésticas identificadas no entorno e interior da FLONA de Itaituba II.
Fonte: Produzido pela autora 1

Quanto à divisão em bacias, considerando as situações de unidades territoriais, conforme as localidades onde habitam, nota-se grande concentração da população distribuída nas unidades domésticas localizadas nas Microbacias 5, 8, 9, 10 e 11, e é na Microbacia 5 que se encontra o maior número de unidades domésticas e na Microbacia 10 se encontra a maior concentração de pessoas (Tabela 4).

Para Sousa e Binsztok (2012), a produção do espaço amazônico se constituiu no século xvii com formação da tríade: drogas do sertão-aldeamento-fortificações, esse cenário está ligado à ideologia geopolítica, religiosa e econômica que contribuiu para o surgimento de vilas e cidades as margens dos rios da região, formando os primeiros núcleos rurais e urbanos.

Tabela 4.
Distribuição das Unidades Domésticas, Estabelecimentos e População por Microbacia da FLONA de Itaituba II.

Fonte: Produzido pela autora 1

Existe um predomínio da população masculina com 56% da população total, nas faixas etárias entre 30 e 39 anos e entre 40 e 49 anos, há poucas crianças e poucas pessoas na terceira idade (acima de 60 anos), essa realidade é reflexo dos movimentos migratórios que ocorreram na área em estudo devido ao garimpo. Tal conformação da pirâmide etária na área de estudo, destoa tanto da pirâmide do Estado do Pará quanto de Itaituba, demonstrando que é uma peculiaridade da FLONA de Itaituba II (Figura 5). Outras formas de ocupação e atividades estão surgindo e contribuem para novas oportunidades de trabalho constituindo em novas perspectivas de emprego para quem atua com agricultura, mas que, por contingência ou opção, não trabalha no meio rural (CONTI, 2012).

3.1.2 A mobilidade espacial na FLONA

Nos fluxos migratórios na FLONA de Itaituba II o tipo rural-rural é predominante, seguido pela migração rural-urbano, urbano-rural e urbano-urbano (Tabela 5). A razão no tipo rural-rural é principalmente pelo acesso a terra, seguida pela dificuldade de trabalho e conflito, no tipo de migração rural-urbano a razão é acesso a serviços e dificuldade de trabalho, a migração urbano-urbano é inexpressiva e está ligada a busca de serviços (Tabela 5).

A migração interna é um fenômeno estrutural e, como tal, não se apreende as suas grandes transformações a não ser do ponto de vista histórico, esse tipo de migração abre possibilidades para os migrantes combinarem uma combinação espacial e social (BRITO et al., 2012).


Figura 5:
Pirâmides etárias- FLONA de Itaituba II, estado do Pará e Município de Itaituba
Fonte:BRITO et al., (2012).

Para Sawyer (1993), a busca de terra própria para trabalhar pode ser o motor principal, mas certamente não o único, como atestam a migração para garimpo e para os núcleos urbanos regionais e envolvimento dos migrantes em grande leque de negócios.

Tabela 5.
Tipo e razão da migração na FLONA de Itaituba II

Fonte: Produzido pela autora 1

A agricultura de autossustento predomina como atividade principal, seguida da garimpagem como atividades desenvolvidas pelas pessoas que migram do rural-rural, já para migração rural-urbano e urbano-urbano a pesca se destaca como atividade principal (Tabela 6).

Tabela 6.
Tipo de migração e atividade principal na FLONA de Itaituba II

Fonte: Produzido pela autora 1

Segundo Alves (1995), a moradia no meio rural permite que as pessoas tenham maior flexibilidade de participar atuar em mais de um mercado beneficiando a renda da família, a localização no rural não depende apenas do mercado de trabalho, mas sim da infraestrutura de transporte, comunicação e de informação, e quando o trabalhador rural decide ofertar seu trabalho na cidade, na realidade, ele está optando pela residência urbana.

Em relação ao local de migração e o tipo de movimentação da população na região da FLONA destaca-se a Aldeia AkayMuûybu como local de migração para o tipo rural-rural, seguida pela Comunidade Pimental e a Vila Tapajós. Entretanto, no tipo rural-urbano as cidades de Itaituba e Trairão foram os locais de migração mais citados. Quanto à migração urbano-rural destacam-se a Aldeia AkayMuûybu, Jacareacanga, Pimental, Sitio Sapucaia e Vila do Lage. Contudo, as cidades de Monte Alegre no entorno expandido da FLONA e Trairão município da FLONA são os locais de migração no tipo urbano-urbano (Tabela 7).

Para Alves (1995), a estrutura agrária influencia na residência da população ativa da agricultura, justificando-se o vinculo do homem a natureza campestre, uma cultura dos campos, que prende o trabalhador ao meio rural e que, portanto, faz com que ele exija maiores compensações para migrar.

Conceição (2015) relata que a questão agrária influencia no aumento das grilagens de terras e na concentração fundiária, sendo indutora do êxodo rural, além de outros conflitos, também implica em uma luta por território contra o capital e por políticas públicas direcionadas ao homem do campo.

Os indivíduos que têm maior propensão a migrar para os grandes centros urbanos ou apenas para fora do ambiente rural são os jovens, que incorrem em menores quantidades de custos, tanto econômicos como psicológicos, mas também se deparam com a falta de renda sistemática (BRUMER; SPAVANELLO; LOPES, 2008).

Tabela 7.
Local e tipo de migração na FLONA

Fonte: Produzido pela autora 1

O baixo grau de instrução reduz o desejo de mudar de residência, A família teme o desemprego e tem menor capacidade de entender o mercado de trabalho, ou seja, o baixo grau de instrução e de treinamento reduzem, portanto, a mobilidade da população (ALVES, 1995).

3.1.3 Qualidade de vida

Saúde e Saneamento

Os principais problemas percebidos nas comunidades são a falta de médicos, remédios e postos de saúde, além do abuso de álcool. Apesar desses problemas quase 62% dos 284 chefes de domicílios (donos e donas) que responderam ao questionário sobre condições de vida declararam que sua vida melhorou desde que chegaram à FLONA de Itaituba II. Para cerca de 22% deles, a vida piorou; para 16% aproximadamente, as atuais condições de vida não diferem daquelas do momento em que se mudaram para a FLONA.

Sobre as condições de saúde, tomando a contracepção como indicador da falta de assistência local, tem-se que das 117 mulheres que responderam questões sobre história contraceptiva, 47 mulheres nasceram ou foram esterilizadas (40%). Dentre as 70 não esterilizadas, 44 nunca usaram métodos contraceptivos (quase 63% das não esterilizadas) e apenas 26 mulheres usam algum método no presente (37% das não esterilizadas).

Doenças endêmicas

Com relação à incidência de malária, 47% das pessoas entrevistadas declararam que já tiveram malária pelo menos uma vez, destas, 11% tiveram a doença 10 ou mais vezes. Os casos de febre amarela são mais raros, apenas cinco indivíduos relataram casos.

A análise espacial de condições de saúde pode ser um instrumento importante na avaliação do impacto de processos e estruturas sociais na determinação de eventos de saúde. Com base nos dados obtidos através das entrevistas, pode-se espacializar os casos de malária e febre amarela por comunidade ou vila, os casos de febre amarela estão distribuídos pela FLONA, os locais com mais de um caso são a Vila Arurí na BR-163 e Comunidade Mangabal no rio Tapajós. Da mesma forma, a malária encontra-se distribuída, sendo que as localidades com mais casos relatados foram Bela Vista do Caracol na BR-163 e a Vila Tapajós no rio Tapajós.

Outras doenças foram citadas, como a diarreia (problema intestinal), hepatite e leishmaniose, na região há a ausência de saneamento e a água não é tratada, Dias (1994) expõe que esses aspectos contribuem para a disseminação de doenças nas populações que consomem essa água, que as condições precárias de higiene, conduzem a poluição do solo e das águas.

Considerando que a doença é uma manifestação do organismo da população instalada naquele local, pode-se dizer que esta é uma manifestação que reflete as condições de vida da população, de modo que a análise de situações de saúde corresponde a uma vertente da vigilância da saúde que prioriza a análise da saúde de grupos populacionais definidos em função de suas condições de vida.

Matiello et al. (2017) em estudo realizado em Áreas de Preservação Permanente - APP em Nova Mutum Paraná-RO observaram a presença de lixo e de focos de queimada, apontaram que esses aspectos prejudicam o ecossistema e a biodiversidade local, e que o despejo de esgoto nos corpus d’água acontece de maneira clandestina devido às falhas no sistema de esgoto, além de poluir os recursos hídricos, pode ser responsável pela contaminação e disseminação de doenças.

3.1.4 Educação

A maioria dos entrevistados (54,7%) estudou por no máximo quatro anos, 30,3 % estudou de cinco a oito anos e 15,1% estudaram de nove anos para cima.

Para avaliar a quantidade da população que frequenta ou não a escola, analisou-se somente a população com idades na faixa de cinco a 19 anos, sendo que a quantidade de pessoas nessa faixa frequentando a escola é quatro vezes maior (210 pessoas) do que o número das pessoas que não frequentam (53 pessoas).

No interior da unidade não existem estabelecimentos de ensino público, concentrando-se as escolas de ensino elementar no entorno. Tratando-se das localidades do Rio Tapajós no entorno da FLONA, existem apenas duas escolas públicas e de ensino fundamental na região que atendem de 1° á 4° séries e atingem apenas as crianças das vilas Tapajós e Vira-Sebo e algumas crianças das localidades próximas. As duas escolas apresentam estruturas semelhantes, construídas em madeira e com cobertura em telhas de amianto e os professores das duas escolas são da rede pública de Itaituba.

No entanto, existem crianças em idade escolar na região que não frequentam a escola. Os motivos são variados: distância de escolas, a falta de transporte, a falta de professor-principalmente para o ensino mais elevado de 5ª à 8ª séries e dificuldade financeira. Essas condições podem colaborar para a baixa escolaridade da população identificada.

3.1.5 Caracterização socioeconômica

As principais atividades econômicas no interior da FLONA decorrem do uso do solo (agropecuária) e do subsolo (mineração). Tais atividades ocorrem em fazendas e em garimpos, unidades aqui denominadas como estabelecimentos. Esses estabelecimentos não são necessariamente unidades territorialmente distintas. Em diversas situações, encontraram-se garimpos dentro de fazendas, áreas cultivadas ou mesmo pastagens junto de garimpos.

Foi visitado um total de 202 estabelecimentos produtivos, destes, nota-se que existem 10 estabelecimentos definidos como exclusivamente de garimpos (sete dentro da FLONA e três no buffer) e nove estabelecimentos combinam garimpos à extração de madeira e/ou à criação de gado. Em compensação, 17 estabelecimentos se dedicam apenas à criação de gado e 66 se dedicam exclusivamente à extração de madeira, sendo 39 na FLONA, um fora e 26 no buffer.

Diversos produtos são produzidos nos estabelecimentos localizados na FLONA de Itaituba II, dentre eles destacam-se a banana em 64 estabelecimentos, a farinha de mandioca produzida, em 51 estabelecimentos e a mandioca em 49 estabelecimentos, bovinos criados em 45 estabelecimentos, galináceos criados em 21 estabelecimentos e suínos criados em 19 estabelecimentos. A maioria destina-se ao uso no próprio estabelecimento ou à troca com os vizinhos. Esta é a realidade das Unidades Domésticas em todas as Microbacias, mas nas Microbacia 11 e na Microbacia 7, a produção excedente é comercializada na região.

A produção de ouro aparece em nove estabelecimentos (agrupados nas vilas da qual fazem parte) que extraíram ouro no ano de 2009. A produção total foi de 49.383g de ouro, sendo que o garimpo Botica foi responsável por 43.200g (quase 90%) de tudo que foi extraído na FLONA, a maioria dos garimpos faz extração de forma manual.

Para Uhl e Martini (1997), a maioria dos garimpos estão concentrados nos igarapés e rios com extração e lavagem de sedimentares que se acumulam na margem e leito proporcionam transformação na morfologia, inclusive com acúmulos de água em poças com água barrenta. Portanto, pode-se dizer que há adoção de técnicas produtivas incompatíveis com os objetivos de uma UC, como por exemplo, o garimpo, as técnicas utilizadas na atividade do garimpo impactam diretamente as nascentes e leitos de rios e igarapés.

Matiello et al. (2017) ao delimitarem as APP de um córrego localizado em Nova Mutum Paraná-RO e analisar a concordância com a legislação vigente e avaliar a qualidade ambiental da região, observaram a carência de vegetação nativa ou até mesmo inexistência em alguns pontos da Área de Preservação Permanente, não contemplando os 30 metros de vegetação conforme a legislação, caracterizando o uso inadequado da APP, o que representa uma ameaça à conservação dos recursos naturais, já que os prejuízos causados por esta ação refletem no clima, na diminuição da biodiversidade, na alteração da paisagem, na degradação do solo e de uma forma geral na perda de qualidade ambiental e consequentemente no bem estar da população.

Ferronato et al. (2016) ao estudarem os aspectos socioeconômicos e ambientais do município de Cujubim/RO, identificaram que a atividade madeireira na região não é feita de forma sustentável, relatam que a falta de compromisso de grande parte do setor madeireiro, desencadeia uma série de fatores que levam a degradação e esgotamento dos recursos naturais da região, e problemas subsequentes como a alteração da forma de uso do solo, de floresta para pastagens, uma vez que as quantidades de madeira extraída das florestas são maiores que sua capacidade de renovação, inviabilizando a atividade e obrigando a conversão da atividade econômica para pecuária.

A pesca é outra atividade que movimenta a vida socioeconômica no entorno e interior da FLONA. Registrou-se que no ano de 2008, na Microbacia 4, o volume extraído foi 988 kg, na Microbacia 5 foi de 19.000kg , na Microbacia 6 foi de 210 kg, na Microbacia 7 foi de 3.775 kg e na Microbacia 10 a produção foi de 510 kg, contabilizando-se um total de 23.157 kg vendidos durante o ano por preço médio de R$ 3,15kg/pescado.

O que se observa é que essa estrutura socioeconômica identificada ocorre numa dinâmica estruturada pelo poder da ação ocupacional tanto no interior quanto no entorno da unidade, que pode estar relacionado com tempo de moradia, grau de parentesco com os pioneiros e atividade econômica mais importante. Dias (1994) enfatiza que os comportamentos que definem o espaço pessoal asseguram o espaçamento do individuo dentro do grupo.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quanto a restrição da presença humana e uso dos recursos naturais na Floresta Nacional de Itaituba II compreende-se que na Unidade de Conservação há circulação de pessoas, há interação com o entorno próximo e expandido.

Compreende-se que na FLONA de Itaituba II a população é pequena está organizada em aglomerados distribuídos nas margens da BR-163, ao longo de rios e igarapés, assim pode-se destacar que existe mobilidade interna na UC.

Há adoção de técnicas produtivas incompatíveis com os objetivos de uma UC, por exemplo, o garimpo, as técnicas utilizadas na atividade do garimpo impactam diretamente as nascentes e leitos de rios e igarapés.

Essa população na FLONA, inclusive com moradores que estão ali antes do ano de criação da unidade, com destaque expressivo pela presença de homens em idade de trabalho e com baixo grau de escolaridade, notadamente realizam atividades produtivas do uso do solo (agropecuária) e subsolo (mineração) que ocorrem em fazendas e em garimpos.

As condições identificadas elevam a preocupação para as mudanças de comportamento diante das regras estabelecidas para o manejo dos recursos naturais importantes, no processo social que se reflete na composição da população residente na Unidade de Conservação.

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Notas

[4] Considerando que a UC ainda não tinha um plano de manejo no momento da pesquisa, baseando-se no Roteiro Metodológico para Elaboração de Plano de Manejo para Florestas Nacionais.
[5] Além da visita e entrevista com moradores, a observação oferece a oportunidade de vivenciar o fato quando ele ocorre pode ser adotado como técnica científica. Orientada por objetivos concretos para análise.
[6] A expressão métodos mistos, mais comumente pronunciada em inglês – mixed methods – ou ainda Mixed Methods Research, se caracteriza como um modo de pesquisa presente em áreas de saúde, educação, psicologia, ciências sociais e ciências sociais aplicadas em que métodos quantitativos e qualitativos são articulados, combinados. O termo bastante empregado em publicações internacionais, mas não no Brasil, onde existe a preferência para um uso não institucionalizado sobre a conjunção “quali-quanti”. Para vários autores, como em Tashakhori e Teddlie (2003) e em Johnson, Onwuegbuzie e Turner (2007), os métodos mistos não se apresentam como uma aproximação localizada entre diferentes metodologias, mas como um terceiro paradigma de pesquisa institucionalizado pela articulação entre o “primeiro”, o quantitativo e o “segundo”, o qualitativo (JUNIOR; D’ANTONA, 1993).

Autor notes

[1] Graduada em Geografia pela Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA. Pesquisadora e coordenadora de projetos do Instituto de Estudos Integrados Cidadão da Amazônia – INEA. E-mail: guimaraes.rosenildes@gmail.com
[2] Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Docente no Instituto de Ciências da Educação na Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA. E-mail: mmcortinhas@gmail.com
[3] Doutora em Agricultura Tropical pela Universidade Federal do Mato Grosso – UFMT. Docente no Instituto de Biodiversidade e Florestas na Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA. E-mail: helionora.alves@ufopa.edu.br

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